sábado, 28 de maio de 2011

hálito divino





















ismail özyurt



fora o que me haure
fora o ar em que ardo das artérias minem
..........................acesas manhãs
ora ainda destempero
em flor o tempo flamo ao que chama
..........................contemple-se ora
o quanto a que aero
o vento acenda aquele outro aureo
..........................o canto que impele
todo em pós em luz
o agora amor em mim hálito divino
..........................ânfora afora

aguardar o que nasce

sexta-feira, 27 de maio de 2011

um minuto de esperança












John Clutterbuck



Um minuto, um minuto de esperança,
e depois tudo acaba. E toda crença
em ossos já se esvai. Só resta a mansa
decisão entre morte e indiferença.

Um minuto, não mais, que o tempo cansa,
e sofisma de amor não há que vença
este espinho, esta agulha, fina lança
a nos escavacar na praia imensa.

Mais um minuto só, e chega tarde.
mais um pouco de ti, que não te dobras,
e que eu me empurre a mim, que sou covarde.

Um minuto, e acabou. Relógio solto,
indistinta visão em céu revolto,
um minuto me baste, e a minhas obras.



[nova reunião - a distribuição do tempo]

e depois?

terça-feira, 24 de maio de 2011

E agora não sei...





















jonastomter
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Disse tão pouco
Dias curtos.

Dias Curtos,
Noites curtas.
Anos curtos.

Disse tão pouco,
Não tive tempo.

O meu coração cansou-se
Do êxtase,
Do desespero,
Do zelo,
Da esperança.

A boca do Leviatã
Engolia-me.

Deitava-me nu junto ao mar
Nas ilhas desertas.

Arrastava-me para o pélago
A baleia branca do mundo.

E agora não sei
O que foi verdade.

mensagem









Stockbyte



Com o consentimento da neve
caminharei devagar.
Alguém haverá à espera junto do fogo
e eu, que estarei cega pelo frio,
farei paragens breves,
sacudirei o guarda-chuva e começarei de novo.

O único segredo é não sentir-se
imensamente cheio de verdades.
Não aceitar nunca os convites
que o nevoeiro
sugere ao fazer ninho com os seus disfarces
de paisagem feliz, de grandes sonhos.

Alguém haverá que diga, perdeu-se,
alguém sairá a procurar-me,
e levará o calor de uma garrafa
onde poderei mandar-te esta mensagem.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

tudo é aconchego...













musicandphotography
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[...]

Tudo é aconchego árido.

Cheiro eterno de Proderm.

Mesa posta, e as garras da vontade.

A gana de procurar um por um

e pronunciar o escândalo.

Falar sem ser ouvida.

Desfraldar pendengas: te desejo.

Indiferença fanática ao ainda não.


[aos teus pés - sábado de aleluia]

onde os outros triunfam





















Amosb
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O que de sublime e doloroso o tempo guarda

precisava disso de maneira que até é difícil

porque se sentia só nos campos

onde os outros triunfam

descia o sombrio, o nocturno atalho



assim chegava cedo de mais à beira não do fim

mas do informulável

para quem as nossas pequenas imposturas

são uma perda, um delito, uma culpa


[baldios - o nocturno atalho]

sempre algum dia...





















p0rg
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os céus não sabem nada de geometria


- nem querem saber dela –


é que neles até as linhas paralelas


se encontram sempre algum dia.

live forever



domingo, 22 de maio de 2011

a vida é feita de mudança

















musicandphotography
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Vejo ainda coisas por dizer: em cada mudança
não somos já quem costumávamos: e quando mudamos,
é quem fomos que fica ainda por mudar. Um ser pode
ser tudo o que quisermos, se o tempo o deixar;
mas não será outro se entre ontem e hoje
se não souber transformar: pois é o desejo,
mais do que a fortuna, que faz com que sejamos
amanhã o que hoje não esperamos ser; a não ser
que o amor nos prenda à sua sorte constante. Então,
de dentro da alma, o sereno rosto procura novas
inquietações; e o teu riso o desperta de entre dias
e estações, convidando-o para a vida que é assim:
feita de mudança, quando tudo vai ficar;
e insistindo em ser o que tinha que mudar.


[por dentro do fruto a chuva - relendo camões]

me embeba com a tristeza

























A tristeza que corrói as tuas frases, com o
gotejar da vida que não tivemos, com o tempo
que não temos nem teremos, com o ruído
de papéis no fundo de armários e de
esconderijos, com as palavras que doem
como pedras e espinhos, com o vento
correndo pelos campos da memória,
como a mulher que te olhou como se não
te visse, e o homem que desviou os olhos
porque nem o sol nem o amor se podem
olhar de frente, essa tristeza cai-me na alma,
rouba-me o riso dos teus lábios, prende-me
à tua dor tão distante como o horizonte. Mas
preciso de te ouvir, mesmo com a tristeza das
tuas frases, com o eco de insónias e solidões,
com o desejo que cai por entre silêncios
e murmúrios, para que a tua voz fique por
dentro de mim, me embeba com a tristeza,
e me dê o tempo das frases que a noite corrói.


[por dentro do fruto a chuva - poema]

do you believe in love?





















Jages
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É domingo de manhã (não é dia útil às três da tarde).

Quando a memória está útil.

Usa.

Agora é a sua vez.

Do you believe in love...?

Então está.

Não insisto mais.



[a teus pés]

boa pessoa

sábado, 21 de maio de 2011

surge então...





















TraceLegacy
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[...]
Surge,
então, aquele olhar que
reivindica a
vida

[mas a vida não é pra
se reivindicar].

Ninguém controla a porta.

[Entrada ou saída].

Nem a passagem de ar pela
garganta.

da minha solidão socorrendo a tua





















Kleemass
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[...]
Temos todo o tempo e o tempo é curto,
Em um minuto o passado elabora
O museu do futuro.

Podemos ainda amar a casa,
Encher as taças,
Inventar algum desejo pequeno
Com ares de importante.

Qualquer disparate
Nós podíamos, se quiséssemos,
Uma fresta de esquecimento
Onde tudo condensa memória.

Preferimos o momento ele puro, de calcário,
A fina arte da escultura.

Pouco importa a cara sufocada,
O corpo flagrado na posição do susto.
Passará a tempestade de pó,
A febre arreganhada passará, o escuro.

Não passará minha solidão socorrendo a tua.

é sempre...






















É sempre no passado aquele orgasmo,
é sempre no presente aquele duplo,
é sempre no futuro aquele pânico.

É sempre no meu peito aquela garra.
É sempre no meu tédio aquele aceno.
É sempre no meu sono aquela guerra.
É sempre no meu trato o amplo distrato.
Sempre na minha firma a antiga fúria.
Sempre no mesmo engano outro retrato.

É sempre nos meus pulos o limite.
É sempre nos meus lábios a estampilha.
É sempre no meu não aquele trauma.

Sempre no meu amor a noite rompe.
Sempre dentro de mim meu inimigo.
E sempre no meu sempre a mesma ausência.


[o enterrado vivo]

saudade

sexta-feira, 20 de maio de 2011

não transbordam como eu...




















ka sau
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Nas longas mesas do tempo

embebedam-se os cântaros de Deus.

Eles esvaziam os olhos de quem vê e os olhos de quem

...........................................................................................[não,

Os corações das sombras reinantes,

o magro rosto da noite.

São os maiores bebedores:

levam à boca o vazio como o pleno

e não transbordam como eu ou tu.


[cristal - os cântaros]

só hoje...


















Volto para trás

nesta paz

de ver nos meus passos

o único sinal profundo

da tarde lilás.


Que bom! Hoje não quero salvar o mundo.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

da alma à flor da pele


















repara
que solidão é mais
estado de alma
que de pele
é mais
estado de sentir
que de estar
e o ser?
em que estado fica
nesse caminho estreito
e não delimitado
da alma à flor
da pele


http://nydiabonetti.blogspot.com

lembranças...

















Sabes que já não durmo por dentro?
Fecho os olhos e afundo-me num poço sem palavras nem espaço,
continuando, sem o saberes, acordado, temendo perder-te.
E tantas vezes te perdi, tantas vezes regressei e não te encontrei,
tantas inquietamente vezes te chamei e não respondeste!
Agora, a meio da noite, escuto a tua respiração
na cama a meu lado, como se eu e tudo, a minha memória
e os meus sentidos (principalmente os meus sentidos),
fôssemos apenas um sonho de outra pessoa,
provavelmente, como poderei sabê-lo?, um sonho teu.


[nenhuma palavra e nenhuma lembrança - 5.]

medos

não procura nos meus lábios tua boca















anderton
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Não procura nos meus lábios tua boca,
não diante da porta o forasteiro,
não no olho a lágrima.

Sete noites acima caminha o vermelho ao vermelho
sete corações abaixo bate a mão à porta,
sete rosas mais tarde rumoreja a fonte.


[cristal]

quarta-feira, 18 de maio de 2011

um dia serão Deus




















Karan Kapoor



Está aqui todo o mistério do amor.
Se dois seres, amando-se, forem um só,
harmonizando o que neles é contrário,
serão como esta árvore e criarão vida e beleza.
Darão a Deus uma cadeia mais e, noutras vidas,
certamente voltarão a encontrar-se.
E um dia estarão eternamente juntos e
serão mais do que humanos,
mais do que anjos,
um dia serão Deus.


[Anjo Branco Anjo Negro]

se os olhos reaprendessem

lavando o ontem...

terça-feira, 17 de maio de 2011

mas estamos tão pouco...





















m0thyyku

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Uma paisagem muito longe
quando se regressa
continuamos a vê-la no escuro

fechamos os olhos e sentimo-nos vivos
na sucessão dos séculos
falamos de súbito
daquilo que nos assusta
um segredo demasiado intenso
o malogro dos códigos
qualquer idéia extrema
que destrói o mundo e não queríamos

MAS ESTAMOS TÃO POUCO
ONDE ESTAMOS


[baldios - mercado velho, machico]

e a distância maior é olhar apenas















xetobyte
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Eis a carta dos céus:
as distâncias vivas
indicam apenas
roteiros
os astros não se interligam
e a distância maior
é olhar apenas.

A estrela
vôo e luz somente
sempre nasce agora:
desconhece as irmãs
e é sem espelho.

Eis a carta dos céus: tudo
indeterminado e imprevisto
cria um amor fluente
e sempre vivo.

eis a carta dos céus: tudo
se move.



[poesia reunida – mapa]

segunda-feira, 16 de maio de 2011

o que em nós...

da verdade do amor
















Da verdade do amor se meditam
relatos de viagens confissões
e sempre excede a vida
esse segredo que tanto desdém
guarda de ser dito

pouco importa em quantas derrotas
te lançou
as dores os naufrágios escondidos
com eles aprendeste a navegação
dos oceanos gelados

não se deve explicar demasiado cedo
atrás das coisas
o seu brilho cresce
sem rumor



[baldios]

demasiado perto

























Era alguém pronto a começar qualquer destino
palavra a palavra esquecia
histórias formas a natureza
e assim de novo se dispunha amá-las
com um amor tão grande
tão grande

a inocência da flecha que propaga
nos bosques o desconhecido
um corpo face ao extenso perigo
"só tenho medo se ficar por aqui
demasiado perto"

a glória, sabes, é uma dor
que por vezes
a doçura esconde


[baldios]

domingo, 15 de maio de 2011

luz na noite




















anjart
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Está em nós recriar a inocência do mundo


Que importa o que nos roubaram

si somente Deus poderá tirar nossa divina quota de

...........................................................eternidade?



[coleção melhores poemas]

sonho de um sonho

















[...]

Sonhei que meu sonho vinha

como a realidade mesma.

Sonhei que o sonho se forma

não do que desejaríamos

ou de quanto silenciamos

em meio a ervas crescidas,

mas do que vigia e fulge

em cada ardente palavra

proferida sem malícia,

aberta como uma flor

se entreabre: radiosamente.


[nova reunião - sonho de um sonho]

buscava o AMAR...

vou como sei ir...





















lunariya
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Se perguntam como vou

nem sei se saberia dizer

que vou assim

como sei ir

sem pressas cada vez menos

sem pressas de chegar

a lugar algum

que saiba saber dizer

assim cada vez menos com um fim

sem pensar

somente a ver

com todos os sentidos

e a gostar

a gostar.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

vinham colher na maresia

num instante se tornam saberes


























admitia a beleza mas não o esplendor
porque são tristes as repetições
num instante se tornam saberes
[...]

prezava apenas os segredos que mesmos ditos
permanecem como segredos

[...]

incapaz de certezas

o que mais belo soube
sempre o disse, de repente,
a alguém que não conhecia


[Baldios]

terça-feira, 10 de maio de 2011

o dia perdoa


















Trent Dabbs - This Time Tomorrow

depois























Nina Karoline


Primeiro sabem-se as respostas.
As perguntas chegam depois,
como aves voltando a casa ao fim da tarde
e pousando, uma a uma, no coração
quando o coração já se recolheu
de perguntas e respostas.

Que coração, no entanto pode repousar
com o restolhar de asas no telhado?
A dúvida agita
os cortinados
e nos sítios mais íntimos da vida
acorda o passado.

Porquê, tão tardo, o passado?
Se ficou por saldar algo
com Deus ou com o Diabo
e se é o coração o saldo
porquê agora, Cobrança,
quando medo e esperança

se recolheram também sob
lembranças extenuadas?
Enche-se de novo o silêncio de vozes despertas,
e de poços, e portas entreabertas,
e sonham no escuro
as coisas acabadas.


[nenhuma palavra e nenhuma lembrança]

segunda-feira, 9 de maio de 2011

e o carinho mudo corta a solidão















© Elisabetta Ronchi



Só o primeiro cão,

em frente do homem

cheirando futuro.

Os dois se reparam,

se julgam, se pesam,

e o carinho mudo

corta a solidão.

Canta uma canção

no ermo continente,

baixo, não te exaltes.


[nova reunião - américa]

vivendo, estamos doendo





















GreenEyezz
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[...]

Não é pois todo o amor alvo divino,
e mais aguda seta que o destino?

Não é o motor de tudo e nossa única
fonte de luz, na luz de sua túnica?

O amor elide a face... Ele murmura
algo que foge, e é brisa e fala impura.

O amor não nos explica. E nada basta,
nada é de natureza assim tão casta

que não macule ou perca a sua essência
ao contato furioso da existência.

Nem existir é mais que um exercício
de pesquisar de vida um vago indício,

a provar a nós mesmos que, vivendo,
estamos para doer, estamos doendo...


[nova reunião - relógio do rosário]

domingo, 8 de maio de 2011

um dia em que se acorda






















Amosb
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[...]

há uma altura, creio
um dia em que se acorda
e se percebe tudo:
a traição do acaso
que dispersa a folhagem do jardim,
a solidão inacessível dos desertos,
a ferocidade da natureza
em certas estações,
essa espécie de errância
que pertence ao silêncio
mais que a qualquer palavra


[baldios - duas cidades, paris]

além do amor...

















[...]

Lá onde eu jazia,
responde-me o hálito,
não me percebeste,
contudo chamava-te

como ainda te chamo
(além, além do amor)
onde nada, tudo
aspira a criar-se.



[nova reunião - a tela contemplada]

feridas que curam

voz obstinada



















Voz obstinada, por que insistes chamando
por um nome que não corresponde mais a mim?
Não é do meu propósito que fiques ao longe sozinha.

Nem tu sabes que espécie de saudade abrolha na noite
e como o silêncio tenta mover-se inutilmente,
quando diriges teus ímãs sonoros,
sondando direções!

Não é do meu propósito, ó voz obstinada,
mas da minha condição.

As aparências dispersaram-se de mim,
como pássaros:
que sol se pode fixar nesta existência,
para te definir a minha aproximação?

Minhas dimensões se aboliram nos limites visíveis:
como podes saber onde me circunscrevo,
e de que modo me pode o teu desejo atingir?

Eu mesma deixei de entender a minha substância;
tenho apenas o sentimento dos mistérios que em mim se equilibram.

Como podes chamar por mim como às coisas concretas,
e assegurar-me que sou tua Necessidade e teu Bem?

imortal

























photoport
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A água da minha memória devora todos os reflexos.

Desfizeram-se, por isso, tôdas as minhas presenças
e sempre se continuarão a desfazer.

É inútil o meu esforço de conservar-me;
todos os dias sou meu completo desmoronamento:
e assisto à decadência de tudo,
nestes espelhos sem reprodução.

Voz obstinada que estás ao longe chamando-me,
conduze-te a mim, para compreenderes minha ausência.

Traze de longe os teus atributos de amargura e de sonho,
para veres o que dêles resta
depois que chegarem a êstes ermos domínios
onde figuras e horas se decompõem.

Não precisaremos falar mais nem sentir:
seremos só de afinidades: morrerão as alegorias.

E saberás distinguir as coisas que perecem desoladas,
olhando para esta água interminável e muda,
que não floriu, que não palpitou, que não produziu,
de tanto ser puramente imortal...